Adjudicação compulsória extrajudicial – Que problema ela pode resolver?
Com o objetivo de simplificar e modernizar os procedimentos relativos aos registros públicos de atos e negócios jurídicos, e de incorporações imobiliárias, recentemente foi aprovada a Lei 14.382/2022.
Dentre os seus diversos artigos, um deles se propõe a resolver um problema, comumente enfrentado nos casos em que a compra e venda de um imóvel foi formalizada por intermédio de uma promessa (contrato particular) ou cessão de direitos. Normalmente, isso ocorre nos contratos de longa duração, cujo valor do imóvel é parcelado e o pagamento é realizado diretamente ao vendedor, que por sua vez, condiciona a transferência da propriedade mediante escritura pública, quando da quitação total do preço.
Seja por falta de conhecimento, perda de contato ou falta de recursos financeiros do comprador para arcar com os encargos para a assinatura da escritura pública, fato é que a situação acaba não sendo regularizada. Assim, tendo o comprador cumprido a sua parte, embora o negócio esteja perfectibilizado, ele não está espelhado na matrícula do imóvel, pois nela consta somente o registro do antigo proprietário.
Além da falta de segurança jurídica, pois em princípio todos os atos devem estar registrados na matrícula, essa situação gera vários problemas para ambas as partes contratantes. O vendedor que não mais detém a propriedade, pode vir a responder por débitos de condomínio ou tributários do imóvel (IPTU), por sua vez, o comprador pode ter que enfrentar problemas relativos à penhora do bem em razão de dívidas do vendedor.
Em que pese saberem as partes que o contrato foi cumprido, sendo, em princípio, mútuo o interesse em realizar o respectivo registro na matrícula, quando não se conseguia pela via consensual, a judicialização, com toda a burocracia e seus custos, era o único caminho.
Assim, a inserção do art. 216-B, na Lei 6.015/73 pela Lei 14382/2022, promete simplificar esse procedimento, permitindo que a regularização com a transferência da propriedade junto à matrícula do imóvel seja resolvida extrajudicialmente, diretamente pelo cartório de registro de imóveis.
O requerimento precisa ser formulado por intermédio de advogado, tanto pelo promitente vendedor quanto pelo promitente comprador, devendo ser instruído com os seguintes documentos: i) promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão, quando for o caso; ii) prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos; iii) certidões dos distribuidores forenses da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação; iv) comprovante de pagamento do respectivo Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI); e v) procuração com poderes específicos.
Uma vez apresentados os documentos, dispõe a Lei que o oficial do registro de imóveis da circunscrição onde se situa o imóvel procederá ao registro do domínio em nome do promitente comprador, servindo de título a respectiva promessa de compra e venda ou de cessão ou o instrumento que comprove a sucessão.
No entanto, de plano, surgem algumas dúvidas quanto ao procedimento. E se enviada a notificação que visa comprovar o inadimplemento da outra parte, ela não for encontrada, será subentendido que houve a recusa? Nesta hipótese, será necessário o esgotamento de todas as tentativas de localização, e se isso não ocorrer, ela terá de ser via edital? E a questão da CND Federal do vendedor, atualmente exigida para a lavratura de escritura pública, será dispensada?
Apesar da certeza dos benefícios advindos da possibilidade da adjudicação compulsória pela via extrajudicial, a interpretação da forma como ela se dará ainda terão de ser esclarecidos, por isso, é importante que essa seja a exceção, e que a regra seja a assinatura da competente escritura pública tão logo haja a quitação do preço, nos casos em que esta for a condição para a transferência da propriedade.