Por Enrico Furtado Bianco

Entenda como a nova lei sancionada pelo presidente Lula em março/2024 (Lei nº 14.825/2024) protege os compradores de um imóvel cujo vendedor detém algum apontamento judicial ativo.

Com a nova lei, um terceiro de boa-fé ainda precisa se preocupar com o imóvel que está comprando?

No atual cenário brasileiro, torna-se essencial garantir a segurança jurídica na compra e venda de um imóvel para os compradores e vendedores.

Neste contexto, em 20 de março de 2024, o atual presidente Lula sancionou a Lei nº 14.825/2024, representando um marco legal significativo para as operações imobiliárias, trazendo importantes mudanças e reforçando a proteção dos envolvidos –comprador e vendedor.

A Lei acrescentou o inciso “V” ao artigo 54 da Lei nº 13.097/2015, artigo que prevê em seu caput a necessidade de registrar todos os negócios jurídicos envolvendo o imóvel em sua matrícula, visando trazer maior transparência e segurança jurídica nas transações imobiliárias.

Com a nova previsão, todas as constrições judiciais que recaem sobre o imóvel (penhora, por exemplo) devem estar averbadas na matrícula do imóvel, sob pena de, em não o fazendo, perder sua eficácia.

Precisamente, com a Lei nº 14.825/2024, o artigo 54 da Lei nº 13.097/2015 passou a vigorar com a seguinte redação:

Art. 54. Os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações:

V – averbação, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição judicial incidente sobre o imóvel ou sobre o patrimônio do titular do imóvel, inclusive a proveniente de ação de improbidade administrativa ou a oriunda de hipoteca judiciária.” (g.n.).

Esta mudança trouxe uma nova camada de proteção legal aos possíveis adquirentes do imóvel, uma vez que possuirão maior clareza e acessibilidade dos reais riscos da operação imobiliária.

A nova previsão seguiu o entendimento do princípio da concentração dos atos na matrícula (artigo 792 do Código Civil Brasileiro), o qual prevê que todos os atos relativos à vida do imóvel devem estar devidamente averbados na matrícula, visando trazer publicidade das restrições para os interessados – especialmente para os futuros adquirentes do imóvel.

Este princípio busca, em sua base, mitigar a ocorrência de fraude contra credores (ato de vender ou transferir bens para evitar o pagamento da dívida), fraude contra terceiros (atos fraudulentos que prejudiquem terceiros não envolvidos na operação) e, principalmente, proporcionar transparência dos ônus existentes aos interessados no imóvel.

O objetivo da lei parecer ser que o chamado de “terceiro de boa-fé” (que não possuí ciência de ônus contra o proprietário ou próprio imóvel) não seja responsabilizado por adquirir um imóvel executado que não possua registro da constrição judicial em sua matrícula.

Em partes, a nova Lei na realidade consolidou o antigo (março/2009) entendimento do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 375) de que é necessário o prévio registro da penhora para caracterização da fraude à execução:

Súmula nº 375 – STJ

O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.” (g.n.).

Entretanto a falta de averbação de constrições judiciais na matrícula não significa que não existirá fraude na alienação do imóvel. Pelo contrário, assim como pontuado pelo próprio STJ por ocasião de referida Súmula 375, caso reste comprovado que o adquirente do imóvel agiu de má-fé em sua compra (tinha ciência da constrição, por exemplo), também poderá ser reconhecida a fraude e anulada a transação.

Ou seja, agora em forma de lei, o reconhecimento de ocorrência de eventual fraude à execução demandará previa averbação/registro na matrícula ou comprovação de má-fé do adquirente do imóvel.

A grande questão por detrás desse entendimento é entender, de fato, o que se considera má-fé. Nesse sentido, é de se frisar, que são muitos os julgados que vão na contramão do que diz expressamente a legislação, entendendo que, para que não seja caracterizada a fraude contra credores, cabe ao adquirente a comprovação da sua boa fé, o que, no entender da jurisprudência majoritária, deveria ser feito pela comprovação de que referido comprador agiu de maneira diligente, solicitando todas as certidões que comprovam que, à época da operação da compra e venda, não havia nenhuma demanda ajuizada contra o Vendedor que pudesse leva-lo ao estado de insolvência.

Nesse sentido e considerando se tratar de recentíssima alteração legal, até sua estabilização e consolidação permanece recomendada a realização de uma análise minuciosa para as operações imobiliárias (Due Diligence Imobiliária), visando salvaguardar a segurança jurídica do terceiro adquirente de boa-fé.

Além disso, é fundamental analisar casos concretos e decisões judiciais relevantes que possam fornecer detalhes sobre a aplicação prática da nova redação legal.

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