Nova lei altera regime trabalhista de pais e mães
Por Fabio Augusto Mello Peres*
Um mês após a Finlândia aprovar uma das mais revolucionárias leis trabalhistas para beneficiar as mulheres – a de equiparação da licença parental para pais e mães, ou seja, agora ambos são afastados por 160 dias em caso de nascimento de filho –, o Brasil aprovou a Lei 14457/2022, que traz novidades nas relações empresas-mães.
Essa lei institui o “reembolso-creche”, benefício que os empregadores concedem, sem natureza salarial (ou seja, não incide IR, INSS ou FGTS), para pais e mães pagarem despesas com creche e pré-escola de filhos entre 11 meses e 5 anos de idade. O benefício precisa ser previsto em instrumento coletivo ou individual e não pode ser dado de forma discriminatória, seletiva ou premiativa.
A contrapartida às empresas é a liberação da obrigação legal de manter local para amamentação para os empregadores que contem com mais de 30 empregadas com mais de 16 anos, prevista no art. 389, parágrafo 1º da CLT.
A lei também reforça formas de flexibilização do contrato de trabalho com a finalidade de apoio à parentalidade, ora por teletrabalho, ora por antecipação de férias (mesmo para os casos em que o período aquisitivo não esteja finalizado), ora pelo uso de banco de horas, entre outras.
Há novidades para os homens. A primeira é a possibilidade suspensão do contrato de trabalho após o fim da licença maternidade da mãe para realização de curso de qualificação profissional de, no máximo, 20 horas, nos termos do art. 476-A da CLT – nesse caso, suspende-se o pagamento de salários, mas não o de benefícios, com a possibilidade de pagamento de ajuda compensatória mensal a ser estabelecida em acordo ou convenção coletiva. A segunda é o direito de acompanhar esposa ou companheira grávida em seis consultas médicas durante a gravidez.
A suspensão do contrato de trabalho também pode ser pedida pela mulher, a qualquer momento, para frequência em curso profissionalizante para “o desenvolvimento de habilidades e competências em áreas estratégicas ou com menor participação feminina”. Nesse caso, faz jus ao pagamento de bolsa paga pelo governo (Lei 7998/90), além de ser possibilitado o pagamento de ajuda compensatória mensal pela empresa, sem natureza salarial. Entretanto, a empregada não pode ser dispensada nos seis meses seguintes ao retorno do trabalho, sob pena de multa no valor de uma remuneração, reversível à trabalhadora.
Nessas partes relativas à suspensão do contrato de trabalho, há uma inconsistência que certamente será alvo de questionamentos judiciais: a nova lei permite a suspensão do contrato por meio de acordo individual, diferentemente da previsão da CLT, que só prevê a suspensão por instrumento coletivo, tendo em vista que a suspensão é medida drástica e excepcional.
O programa Empresa Cidadã recebeu algumas modificações. A prorrogação da licença maternidade de empregadas de empresas aderentes ao programa pode ser compartilhada pelo pai e pela mãe, e as aderentes também podem substituir essa prorrogação da licença por redução da jornada da mãe em 50% pelo prazo de 120 dias, com pagamento integral do salário.
Por fim, outra medida de cunho trabalhista na Lei é a necessidade de que as CIPAs agora incluam regras de conduta a respeito de assédio sexual e de outras formas de violência de gênero dentro das empresas e procedimentos para recebimento e acompanhamento de denúncias (sem prejuízo da ação penal competente), além da realização de ações, a cada 12 meses, de ações de capacitação, orientação e sensibilização dos empregados e empregadas acerca desses temas. As CIPAs têm o prazo de 6 meses, a contar de 21 de setembro de 2022, data de edição da lei.
Ainda há um abismo entre os mercados de trabalho do Brasil e da Finlândia, principalmente no que diz respeito à igualdade de gênero. Entretanto, é um caminho natural que o nosso país aumente cada vez mais o incentivo à maternidade, não apenas por questões ético-morais, como também demográficas, considerando a rápida diminuição da taxa de natalidade, o que terá efeitos de médio e longo prazo bastante problemáticos para a economia.
*Fabio Augusto Mello Peres é advogado, sócio trabalhista de Brotto Campelo Advogados, bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná, pós-graduado em Economia do Trabalho e Sindicalismo pela Unicamp e membro relator da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/PR, coordenador do Grupo de Trabalho de Relações de Trabalho de Novas Tecnologias.