Alterado o regime do contrato de aprendizagem
Por Fabio Augusto Mello Peres, sócio e advogado trabalhista do Brotto Campelo Advogados
No último mês (maio/2022), houve a edição da Medida Provisória 1116/2022, que institui o Programa Emprega + Mulheres e Jovens e que altera o regime do contrato de aprendizagem, e do Decreto 11061/2022, que trata especificamente do contrato de aprendizagem. A MP é inovação legislativa de iniciativa do Poder Executivo Federal, que precisa passar pelo crivo do Congresso Nacional, enquanto o Decreto tem aplicabilidade direta às relações jurídicas.
A primeira observação que salta aos olhos é que, mais uma vez, o governo faz alterações na lei afetas a matéria trabalhista sem a consulta tripartite. Trata-se de princípio ao qual o Brasil se submete por ser signatário da Convenção 144 da Organização Internacional do Trabalho, segundo o qual qualquer norma de natureza trabalhista/sindical precisa ser submetida a consultas dos representantes dos trabalhadores e dos empresários.
A segunda é que tanto a MP quanto o Decreto são bastante extensos. O Programa de incentivo à inserção e manutenção do emprego de mulheres e jovens previstos na MP tem detalhes que não serão ora tratados por fugirem ao assunto principal do presente artigo, embora haja uma novidade que pode ter impacto na vida de muitas trabalhadoras: a liberação do FGTS para o pagamento de despesas de creche.
As alterações trazidas pela MP na parte da CLT que trata do contrato de aprendizagem são significativas. Primeiro, institui o Projeto Nacional de Incentivo à Contratação de Aprendizes, a ser ainda regulado pelo Ministério do Trabalho e Previdência. As empresas que aderirem a esse Projeto terão prazos diferenciados para regularização da cota, não serão autuadas nesse prazo, terão os processos de multa por descumprimento da cota suspensos e o valor da multa será reduzido em 50%.
Essas disposições relacionadas às multas e cotas causaram grande comoção no meio dos auditores fiscais. Os profissionais que coordenam a área nos 27 entes federativos pediram exoneração no dia seguinte, com uma carta criticando fortemente a MP.
Não foram alteradas as cotas atuais, mas, pelas previsões da MP, o contrato de aprendizagem pode ter até 3 anos, à exceção dos casos das pessoas com deficiência (sem limite de tempo) ou dos aprendizes de 14 e 15 anos de idade ou, ainda, dos aprendizes que contam em dobro na contagem da cota (4 anos em ambos os casos).
Contam como o dobro da cota egressos do sistema socioeducativo ou que estejam cumprindo pena do sistema prisional, integrem família beneficiária do Auxílio Brasil, pessoas com deficiência, egressos do trabalho infantil, entre outras categorias que, naturalmente, possuem mais dificuldade para inserção no mercado de trabalho.
Outra possibilidade aberta pela MP é a da celebração do contrato de aprendizagem por organizações sem fins lucrativos, que serviriam de verdadeiras “intermediárias” para tomadoras de mão de obra dos aprendizes – nesse sistema, não será contado como vínculo empregatício com o tomador de serviços.
Por fim, o Decreto 11061, por ter natureza meramente regulatória (Decretos não podem criar/extinguir direitos, pelo princípio da separação dos poderes), traz apenas alterações pontuais no Decreto 9579/2018, o qual é o principal diploma de regulação do assunto aprendizes e que guia a fiscalização do cumprimento das cotas.
Como se vê, houve mudanças bastante significativas no assunto. Cabe lembrar que Medida Provisória deve ser apreciada pelo Congresso, que pode aprová-la, rejeitá-la ou deixar o prazo máximo de 120 dias passar, após o qual cai a eficácia da medida, conservando-se todas as relações jurídicas regidas por ela.