Aspectos e Ajustes do ISS Simplificado em Curitiba
Dia 04 de março, a Prefeitura de Curitiba aprovou o Decreto n° 138, que regulamenta o regime especial (optativo) do Imposto Sobre Serviços para atividades de construção civil, batizado como “Regime Simplificado de Arrecadação do ISS”. De acordo com este sistema, as construtoras poderão optar por recolher o tributo à alíquota de 2%; no entanto, sem realizar quaisquer deduções de sua base de cálculo. As deduções a que se refere o regulamento seriam, em especial, a parcela referente aos materiais aplicados no serviço, como previsto pela legislação municipal no regime normal, e do próprio ISS recolhido pelo subempreiteiro, que era autorizada pelo Decreto-Lei 406/68, mas teve o correspondente dispositivo vetado quando da publicação da Lei Complementar Federal n° 116/2003 – que o segmento da construção vem lutando para que seja reimplementado. Tal qual ocorre no Simples Nacional, a opção pelo Regime Simplificado do ISS de Curitiba será irretratável para o exercício: uma vez inscrita, a empresa só poderá alterar sua opção para o ano seguinte.
A alíquota de 2% foi escolhida em razão das estatísticas que compõem o contexto da tributação das construtoras. Em média, os prestadores costumam empregar cerca de 60% do valor do serviço em materiais, que, nos termos da legislação federal, não integram a base de cálculo do ISS. Assim, a parcela restante, de aproximadamente 40%, é que é oferecida à tributação perante a alíquota de 5%. Em termos matemáticos, a aplicação de 2% sobre o valor total (sem deduções) apresenta resultado equivalente quanto ao imposto a ser recolhido.
Ainda que não haja redução na carga tributária, a aprovação do novo regime representa uma importante vitória para a classe, eis que torna a apuração do imposto menos burocrática, com a desnecessidade de levantamento de notas fiscais de todos os materiais utilizados e de sua efetiva vinculação a determinada obra. Isso resolve um problema particularmente comum por ocasião da substituição tributária, em que o prestador se vê obrigado a comprovar ao tomador a quantidade de material empregado, para que a retenção seja feita sobre a base “líquida”. Não são raros os casos em que as partes não chegam a consenso sobre o montante devido, gerando retenções a maior. Com a nova regulamentação, basta o prestador comprovar sua opção pela sistemática simplificada, e o tomador de serviços deverá fazer a retenção de 2% sobre o valor da nota fiscal.
De outro lado, contudo, ficam as construtoras que empregam tradicionalmente mais de 60% de materiais em seus serviços. No caso de uma empresa em que o custo dos materiais represente, por exemplo, 80% do valor da nota, não será vantajoso, a princípio, aderir ao regime simplificado, já que haverá uma dedução volumosa na base de cálculo, resultando em valor menor de imposto a recolher. E para estas empresas, que permanecerem no regime normal de tributação, a nova normativa tornou o procedimento mais burocrático. Primeiramente, todo e qualquer material deve ser vinculado expressamente à obra em que for empregado (art. 7° do Decreto). Conforme entendimento já manifestado pelos agentes fazendários, a vinculação à obra se comprova pelo endereço de entrega constante da nota fiscal. Quando os materiais são entregues no endereço da sede da construtora (para integrar o estoque), a empresa deve, segundo os fiscais, efetuar notas de transferência das unidades para a obra em que forem empregadas.
Ademais, a dedução do valor referente aos materiais, para as construtoras continuarem no sistema normal, só será possível mediante homologação prévia da autoridade fazendária quanto aos valores aplicados (art. 5° da Lei Complementar n° 66/2007). Neste particular, aliás, o Decreto restou silente quanto às formalidades do procedimento e dos prazos a serem observados, tanto pelo contribuinte quanto pela fiscalização. Assim, entendemos que esta obrigação não possui vigência enquanto não houver regulamentação quanto a estes aspectos, já que o dispositivo da lei complementar acima referido determina expressamente que “os prestadores de serviço que não optarem pelo Regime Simplificado somente poderão efetuar as deduções mediante homologação prévia das mesmas pelo órgão fiscalizador, na forma que dispuser o regulamento”.
Outrossim, interessante observar a seqüência de mudanças quanto ao instituto da responsabilidade tributária por substituição. A partir da vigência da Lei Complementar n° 48/2003, os tomadores de diversos serviços, dentre os quais as atividades ligadas à construção civil, passaram a ser obrigados a reter e recolher o imposto devido pelo prestador, sob pena de responder, em lugar deste, pela satisfação do crédito tributário. Contudo, ao final do ano passado, foi editada a Lei Complementar n° 65/2007, que, ao encontro aos interesses do segmento, afastou a incidência da substituição tributária, exceto no caso de serviços prestados, em Curitiba, por empresa com sede em outra cidade. Eis que, no Decreto recém-aprovado, fica determinado, em seu art. 9°, que a retenção é devida independentemente da localização da sede do prestador, contrariando o dispositivo legal. Neste aspecto, cumpre-nos observar que o dispositivo contido no Decreto carece de validade, já que, além de andar contra a própria legislação municipal, acaba por ferir o princípio constitucional da legalidade, que assegura que obrigações só podem ser criadas por lei formal.
O cenário é positivo: a Prefeitura Municipal mostrou boa vontade ao atender alguns anseios do setor da construção civil, que está satisfeito com esta importante conquista. Porém, a regulamentação carece de alguns ajustes para que não pairem contradições entre as disposições normativas, ou que deixem de ser observadas garantias fundamentais dos contribuintes.