Os impactos da MP da Liberdade Econômica na vida empresarial
Por Pedro Camargo
A elevada burocracia é uma realidade indigesta para todos que pretendem abrir um negócio ou investir em algum empreendimento no Brasil. Pode-se dizer, inclusive, que ela é uma das causas fundamentais da 109ª colocação que o país ocupa no ranking das economias em relação a facilidade para fazer negócios[1].
Desde a obtenção do registro da empresa, até a disponibilização de alvarás e licenças para desenvolver suas atividades, comumente o cidadão se depara não apenas com a burocracia, mas também com a arbitrariedade e despesas dela decorrentes.
Nesse sentido que a Medida Provisória nº 881/2019[2] foi publicada pelo Governo Federal no último mês de abril. Como uma tentativa de proporcionar melhores cenários para os negócios em curto prazo, a lógica empregada pela ‘MP da Liberdade Econômica’ – como foi nomeada – tem a missão de diminuir a burocracia e simplificar os procedimentos da Administração Pública, especialmente, para os pequenos empreendedores, mas não somente a eles.
Dentre as inovações proporcionadas pela Medida, encontram-se importantes alterações legislativas, particularmente, ao Código Civil, Lei de Falência e Lei das S.A. Considerando a brevidade que caracteriza a MP nº 881/2019 – possui dezoito artigos somente –, os principais reflexos legais estão concentrados nos dez incisos do art. 3º e nas disposições finais.
O art. 3º, IV garante ao particular o direito a receber “tratamento isonômico de órgãos e de entidades da administração pública quanto ao exercício de atos de liberação econômica”, sendo que tais atos passam a ter de observar os mesmos critérios utilizados em decisões administrativas anteriores.
Com esse dispositivo, as decisões administrativas passam a ter efeito vinculante, isto é, a autoridade competente deve observar não só os critérios utilizados, mas a própria decisão anterior como modelos para a tomada de uma decisão, aumentando a previsibilidade e, porquanto, diminuindo os riscos das operações financeiras que dependam, por exemplo, da expedição de um determinado alvará ou licença para desenvolvimento de suas atividades.
Na mesma lógica, o art. 3º, V institui a presunção da boa-fé aos “atos praticados no exercício da atividade econômica” diante de eventuais dúvidas acerca da interpretação da legislação aplicável, coroando, por assim dizer, a autonomia da vontade e valorizando as disposições contratualmente estabelecidas pelos particulares.
Ainda no intuito de demonstrar os possíveis e pontuais impactos da MP da Liberdade Econômica na atividade econômica privada, sem a pretensão de se exaurir todas elas, até porque não seria possível pelas circunstâncias, salienta-se a mudança na redação dos artigos 50, 423, 480-A e 480-B, as quais representam verdadeiro incentivo à boa redação contratual, uma vez que as partes de um contrato particular terão, em decorrência da presunção da boa-fé e da primazia do interesse privado, a possibilidade, inclusive, de determinar a correta interpretação de dispositivos legais à relação contratual em que estejam ingressando.
Dessa maneira, a Medida Provisória nº 811/2019 representa, essencialmente, uma incerteza, não apenas pelas quebras de paradigmas proporcionadas – as quais são identificadas sem a necessidade de se adentrar à níveis ideológicos e de teorias econômicas –, mas também pelo nível de aceitação que vem tendo pela sociedade.
Considerando que a MP da Liberdade Econômica precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional dentre de 120 dias, contados de 30/04/2019, quando foi publicada, as discussões em torno dela têm se mostrado ávidas, sendo defendidas por aqueles que a veem como necessidade para o desenvolvimento econômico brasileiro, ao passo em que alguns ainda a encaram como incoerentes com outros institutos legais e até constitucionais.
Por ora, o que se tem é uma Medida Provisória vigente, cujos direitos previstos às empresas e cidadãos já devem ser observados, principalmente pelos próprios particulares que passam a ter maior previsibilidade e menor risco nas tomadas de decisões e contratação.
[1] Classificação realizada pelo The World Banking em 2018, disponível em: <http://portugues.doingbusiness.org/pt/rankings>
[2] Íntegra do texto disponível em: <https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=7946806&ts=1558040719011&disposition=inline>