As polêmicas da rescisão da promessa de compra e venda
Artigo publicado na Revista Imóvel Magazine, edição julho/agosto de 2015
A aquisição de imóveis é tida, há muito tempo, como uma ótima opção de investimento. Seja para auferir rendimentos com o aluguel ou para lucrar com a valorização na revenda, as pessoas veem na compra do imóvel uma alternativa sólida e segura para investir seu capital, especialmente para empreendimentos ainda em fase de construção, com opção de pagamento de um sinal de negócio e outra parte em parcelamento feito diretamente com a incorporadora.
Todavia, ao contrário do que ocorre em outras modalidades de investimentos, a compra de um imóvel é um ato vinculativo, e a ruptura unilateral do contrato antes do pagamento das parcelas assumidas traz consequências negativas tanto para a incorporadora quanto para o comprador. Surgem, então, conflitos judiciais contrapondo, de um lado, a proteção ao consumidor, que não pode perder integralmente o valor investido, e, de outro, os direitos da incorporadora, que não deve arcar com os prejuízos ocasionados pela decisão do comprador.
Via de regra, os contratos de promessa de compra e venda contemplam cláusula disciplinando a possibilidade de rescisão por decisão do comprador (ou mesmo em caso de inadimplência deste), casos em que se prevê a devolução dos valores pagos, mas estabelecendo um percentual que será retido pela incorporadora para fazer frente aos custos decorrentes da devolução da unidade.
Todavia, enquanto as incorporadoras costumam definir uma percentagem calculada sobre o valor do imóvel, os consumidores vêm obtendo decisões judiciais determinando a aplicação exclusivamente sobre os valores que já haviam sido pagos pelo comprador. Os percentuais vêm sendo definido entre 10% e 20%, sendo elevados nos casos em que o adquirente chegou a ocupar o imóvel. Os tribunais ainda têm entendido que a empresa não pode reter o valor do “sinal de negócio” a título de arras, pois neste tipo de contrato elas possuem natureza confirmatória.
Na prática, estes valores não compensam a incorporadora pelos prejuízos gerados pela devolução. Considerando apenas a comissão de corretagem paga pela venda, a empresa gastou, na venda, em torno de 5% sobre o valor total do imóvel, ao qual se somam, ainda, as despesas proporcionais com plantão de venda, material publicitário, além das perdas tributárias, dentre outras.
Vale observar que as rescisões de promessa de compra e venda, geralmente, ocorrem quando o comprador quitou menos de 30% do valor do imóvel. Ou seja, se a devolução for de apenas 10% do valor pago, a retenção final, em favor da incorporadora, resultará em de cerca de apenas 3% do valor do imóvel, o que não cobre sequer as custas com corretagem acima mencionadas.
Respeitadas as opiniões contrárias, entendemos que as decisões judiciais que impõem retenções ínfimas em favor das empresas são orientadas por uma visão excessivamente protecionista ao consumidor, contaminadas ainda por uma visão parcial e obtusa sobre o papel das incorporadoras no mercado de consumo.
A nosso ver, a jurisprudência deve evoluir para assegurar que o percentual de retenção seja suficiente pelo menos para fazer frente às perdas acima mencionadas. Se, por um lado, o consumidor não deve ter seu investimento gravemente sacrificado, por outro, a incorporadora não pode ser tratada como um banco de investimentos, em que se pudesse livremente aportar e retirar aplicações como se isso não a trouxesse prejuízos.
Ricardo Campelo – Advogado