O Seguro nos Contratos de Venda de Imóvel com Alienação Fiduciária em Garantia
Publicado no Informativo do Sinduscon/PR – Março de 2014
A utilização da alienação fiduciária como garantia tem sido cada vez mais freqüente no mercado imobiliária. Apesar de a legislação atinente à matéria ser de 1997, muitos questionamentos estão aflorando somente agora, como o que diz respeito à obrigatoriedade ou não da inclusão de seguro por morte ou invalidez permanente nos contratos de compra e venda de imóvel que contenham cláusula de alienação fiduciária em garantia.
A alienação fiduciária em garantia para negócios imobiliários foi instituída pela Lei nº 9.514/1997, a mesma que instituiu o SFI – Sistema de Financiamento Imobiliário. É importante analisar a lei sob dois enfoques: a disciplina das “operações de financiamento imobiliário no SFI” (art. 5º) e a “alienação fiduciária de coisa imóvel” (arts. 22 e seguintes).
A parte inicial da lei trata, de maneira geral, do SFI, estabelecendo quais são as entidades que nele podem operar, e estatuindo alguns requisitos para a realização destas operações. Neste ponto, vale destacar o art. 5º, IV, que determina a obrigatoriedade de contratação de seguro:
“Art. 5º As operações de financiamento imobiliário em geral, no âmbito do SFI, serão livremente pactuadas pelas partes, observadas as seguintes condições essenciais:
(…)
IV – contratação, pelos tomadores de financiamento, de seguros contra os riscos de morte e invalidez permanente.”
Observe-se que, nesta parte da lei, se está a tratar de quaisquer “operações de financiamento imobiliário” realizadas no âmbito do SFI, operações estas que podem ter como garantia quaisquer das modalidades mencionadas no art. 17, e não apenas da alienação fiduciária. Ou seja, não se trata de dispositivo que regula os contratos com alienação fiduciária, mas sim as operações de financiamento imobiliário em geral.
Outrossim, conforme indicado pela lei, a obrigação de contratação de seguro vale para operações realizadas “no âmbito do SFI”, ou seja, realizada pelas entidades definidas no art. 2º:
“Art. 2º Poderão operar no SFI as caixas econômicas, os bancos comerciais, os bancos de investimento, os bancos com carteira de crédito imobiliário, as sociedades de crédito imobiliário, as associações de poupança e empréstimo, as companhias hipotecárias e, a critério do Conselho Monetário Nacional – CMN, outras entidades.”
Não é o caso de contratos entre as incorporadoras e os adquirentes de imóveis, uma vez que a incorporadora não é agente do SFI. Na realidade, a incorporadora não realiza “operação de financiamento imobiliário”, mas sim de “comercialização de imóveis com pagamento parcelado”, hipótese esta que foi contemplada também no art. 5º da lei, em seu § 3º:
“§ 2º – As operações de comercialização de imóveis, com pagamento parcelado, de arrendamento mercantil de imóveis e de financiamento imobiliário em geral poderão ser pactuadas nas mesmas condições permitidas para as entidades autorizadas a operar no SFI.”
Ou seja, o legislador atentou-se para a diferença entre uma modalidade e outra de negócio, estabelecendo que, na venda parcelada, ou seja, no parcelamento da dívida diretamente com a incorporadora, “poderão” ser pactuadas as mesmas condições estabelecidas para as entidades do SFI. Logo, trata-se de uma faculdade aberta pela lei, e não uma obrigação.
Voltando a analisar a lei, a figura da “alienação fiduciária de coisa imóvel” só passará a ser tratada de maneira individualizada nos arts. 22 e seguintes, como uma das formas de garantia para as operações de financiamento imobiliário.
Quanto ao instrumento contratual que instituirá a garantia de alienação fiduciária, a mesma lei estabelece seus pré-requisitos no art. 24, como a definição do valor da dívida, o prazo e as condições de pagamento, a taxa de juros e os demais encargos, dentre outros. Não se fala, em tal dispositivo, sobre a necessidade de contratação de seguro especificamente para o contrato de aquisição com garantia fiduciária.
Portanto, compreendida a diferença entre a operação de financiamento imobiliário e a venda pela incorporadora com pagamento parcelado (vulgarmente denominado “financiamento com a construtora”), é clara a conclusão no sentido de que a contratação de seguro somente é obrigatória em “operações de financiamento imobiliário” – assim entendidos os negócios firmados por “entidades do SFI”. Já nas vendas de imóveis com pagamentos parcelados, realizadas pelas incorporadoras, a contratação do seguro é facultativa.
De outro lado, vale registrar que as companhias securitizadoras de créditos, quando avaliam a possibilidade de comprar carteiras de recebíveis, via de regra exigem que os contratos de compra e venda de imóveis tenham incluído o seguro por morte e invalidez permanente. Assim, caso o empreendedor tenha a intenção de negociar seus recebíveis por via de securitização, é importante incluir, no contrato, a contratação do referido seguro, a despeito da ausência de obrigação legal.
Ricardo Campelo – Advogado