Norma de Desempenho: parâmetros fundamentais para construtores e consumidores
Artigo publicado na Revista Imóvel Magazine, edição setembro/outubro 2013
O consumidor compra um imóvel e, insatisfeito com o barulho que chega do apartamento vizinho, inicia um litígio com a construtora. O caso vai para o Judiciário, e uma perícia é requisitada para avaliar se o pleito do consumidor tem fundamento. O perito, então, vai até o apartamento do consumidor e pede para que seu assistente, no andar superior, jogue objetos no chão para que ele possa aferir o ruído provocado. Convencido de que o barulho encontrado foi acima do tolerável, o perito apresenta seu laudo, que culmina na condenação da construtora a receber o imóvel de volta, devolvendo ao consumidor o valor investido, além de indenizá-lo por danos morais.
O caso narrado acima é verídico. Assim como esta, várias outras discussões de natureza similar foram parar na Justiça, ora com ganho de causa para os consumidores, ora para as construtoras. Notava-se a ausência de um referencial técnico, claro e objetivo, para aferir o desempenho de edificações, evitando esta carga de subjetividade nas perícias e nos julgamentos.
Neste sentido é que, após muitos debates, incluindo consultas públicas, foi publicada pela ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas a NBR nº 15575, conhecida como Norma Técnica de Desempenho. Sua característica principal é a de, ao contrário das milhares de normas prescritivas vigentes para o setor, estabelecer critérios para a avaliação do desempenho de uma edificação, seja no aspecto acústico, estrutural, térmico, lumínico, de estanqueidade ou de durabilidade.
Para discussões envolvendo isolamento acústico, como o exemplo narrado acima, a NBR 15575 traz critérios objetivos (ao invés das disposições genéricas das NBR 10151 e 10152, por exemplo) para o desempenho exigível da edificação residencial, estabelecendo não só o índice de decibéis tolerável, mas também os coeficientes de redução de ruído esperados para paredes entre ambientes, pisos e fachadas, dispondo ainda sobre os métodos a serem aplicados para verificação do atendimento destes níveis.
Apesar de não ter força de lei, a Norma de Desempenho ganha caráter obrigatório por conta de dispositivos legais vigentes, como o art. 39 do Código de Defesa do Consumidor, que veda a comercialização de qualquer produto ou serviço “em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas”. Ou seja, o consumidor que receber um imóvel cujo desempenho não respeitar as orientações da NBR 15575 terá subsídios técnicos para pleitear reparos ou mesmo optar pela sua devolução, isso quando o caso não se acabar em um litígio que pode implicar na condenação da construtora a indenizações de ordem material e moral.
A vantagem para o construtor, além de passar a ter parâmetros claros para aferir o bom desempenho de sua obra, afastando pleitos indevidos, é que o conteúdo da Norma de Desempenho favorece a identificação de responsáveis por eventuais anomalias construtivas (vícios ou defeitos) encontradas no imóvel, que podem alcançar o projetista, o fornecedor de materiais, e até o próprio usuário da edificação.
Os projetistas estarão obrigados a especificar a VUP – Vida Útil do Projeto para as diversas partes da edificação, devendo indicar os materiais, produtos e processos que deverão ser utilizados para que a edificação atenda ao desempenho estabelecido na Norma. Deverá discriminar, ainda, os processos de manutenção, uso e operação a serem seguidos pelos usuários para que o desempenho seja assegurado e a vida útil atingida.
O texto da norma é enfático em exigir a correta manutenção da edificação por parte dos usuários, dentro da periodicidade determinada pelo projetista, como condição para a validade da garantia da obra pelo construtor. Assim, reforça-se a importância, para os construtores, da elaboração e entrega, ao usuário, de um manual de uso, operação e manutenção adequado, o que pode representar a isenção de sua responsabilidade em caso de defeitos ocasionados por mau uso ou, principalmente, quando o consumidor deixar de realizar a manutenção exigida.
A NBR 15575 abrange apenas edificações de caráter residencial, e passará a ser exigível a partir de 19/07/2013, não se aplicando a obras em andamento ou já concluídas. Chegou a hora de todos os envolvidos na construção civil estudarem, conhecerem e atenderem a este importante ato, dos mais relevantes para o setor.
Ricardo Campelo – Advogado